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Ciência e tecnologia em perigo, artigo de Marco Antônio Raupp
Publicado em: 29/04/2009,00:00
Ciência e tecnologia em perigo, artigo de Marco Antônio Raupp Fonte: Jornal da Ciência nº3750, de 28 de Abril de 2009 Obviamente não se quer que as relações entre as Ifes e as fundações sejam isentas de fiscalização. O problema não é esse; as questões que envolvem as relações das Ifes e suas fundações de apoio são mais amplas e dizem respeito ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e, portanto, ao futuro do país Marco Antônio Raupp é presidente da SBPC. Artigo publicado no Jornal do Brasil: Por meio do acórdão 2731/2008, o Tribunal de Contas da União (TCU) está em vias de travar uma das engrenagens que fazem funcionar o sistema de ciência, tecnologia e inovação do país. Motivado por denúncias de irregularidades, o TCU investigou as relações entre universidades federais e suas respectivas fundações de apoio, analisando um conjunto vale dizer, restrito de contratos firmados entre algumas dessas instituições. Como resultado das investigações o TCU emitiu o acórdão 2731/2008, que pode ser traduzido como uma sentença de reprovação para as relações universidades-fundações de apoio e em um conjunto de recomendações que acabarão por provocar prejuízos incalculáveis ao país. Para se ter uma ideia do alcance dos riscos dessas recomendações, o Ministério da Ciência e Tecnologia viu-se na obrigação de solicitar ao TCU o prazo de um ano para a aplicação do dispositivo do acórdão que determina ao MCT orientar as agências financiadoras, fundos e órgãos subordinados para que não efetuem contrato ou convênios de repasse de recursos financeiros, com objetivos de fomento à pesquisa científica ou tecnológica, diretamente para fundações de apoio a Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), se destinados a projetos abrangidos pela Lei nº 8.958/94, hipótese em que tais avenças devem ser feitas diretamente com as Ifes. A título de esclarecimento, a Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994, foi criada exatamente com a finalidade de dar parâmetros e respaldo para as relações entre as instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio... Obviamente não se quer que as relações entre as Ifes e as fundações sejam isentas de fiscalização. O problema não é esse; as questões que envolvem as relações das Ifes e suas fundações de apoio são mais amplas e dizem respeito ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e, portanto, ao futuro do País. Depois de um período em que se consolidaram como instituições de ensino e passaram a contar, entre seus docentes, com uma porcentagem majoritária de mestres e de doutores o que ocorreu a partir da década de 1990 , as universidades públicas brasileiras estavam capacitadas para ampliar sua colaboração com o desenvolvimento do país. Em vez de somente formar recursos humanos, elas poderiam, então, incrementar suas atividades de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e prestação de serviços com agregado tecnológico singular, aumentando ou criando novos canais de interligação com a sociedade em geral. Entende-se por sociedade em geral os órgãos públicos das mais diversas áreas (saúde; educação básica; saneamento; segurança; transporte, etc); empresas, especialmente as ligadas à produção; e diferentes instituições, notadamente as que desempenham alguma função social e aquelas que se dedicam ao avanço tecnológico. Para cumprir esse novo papel, social e econômico, de relevância inquestionável e improrrogável, as nossas universidades públicas tinham que resolver um problema operacional básico: não se submeter às amarras da legislação que rege os órgãos públicos da administração direta, especialmente a Lei 8.666/93, mais conhecida como a Lei de Licitações, e o regime jurídico único dos servidores federais. Dentro do rigor da lei, a solução foi a criação das fundações de apoio. Não se discute a necessidade para o país da existência de uma legislação que regule as compras e contratos do serviço público, mas sejamos objetivos e claros a prática da ciência e a busca do avanço tecnológico não condizem com excessivas limitações e amarras administrativas e jurídicas. A compra de um reagente químico, fundamental para o desenvolvimento de um novo material para indústria, ou de um computador de grande porte, imprescindível para a melhoria da previsão do tempo para a agricultura ou para a defesa civil, não pode, na maioria das vezes, ficar submetida aos prazos inconstantes de um processo burocrático da administração pública direta. As fundações de apoio, por outro lado, com seu perfil de entidade pública de direito privado, ofereciam agilidade administrativa compatível com a execução de projetos científicos e tecnológicos. O acórdão do TCU neutraliza essa agilidade; subtrai das nossas universidades federais braços e pernas com os quais elas se movimentam não no ritmo da burocracia estatal mas sim no timing da ciência e da tecnologia. Vivemos num período que se caracteriza pela economia do conhecimento, em que o paradigma do desenvolvimento econômico é aliar recursos naturais a conhecimento científico e tecnológico. O gerenciamento desse processo por meio dos atores da ciência e tecnologia no Brasil é fundamental, principalmente se considerarmos que 95% das instituições que geram pesquisa no país são estatais. Controle e fiscalização das fundações obrigatoriamente devem existir, mas sem descaracterizar a personalidade delas, garantida pela lei. Diminuir a capacidade de gestão dessas entidades é matar o futuro da sociedade brasileira. (Jornal do Brasil, 19/4) Rita Juliano / Natália Aquino Assessoria de Comunicação LNCC Laboratório Nacional de Computação Científica 24 2233 6039 imprensa@lncc.br